13 março 2007

Há 35 anos



« -Tal como se encontra legislado, que perspectivas abre a nova lei de cinema?

- Há muita coisa com que não estou de acordo, como todos nós, evidentemente. Mas o que mais choca é verificar que a Lei irá proteger mais as entidades exploradoras do cinema do que aqueles que afinal o produzem. A abertura e preferência dada às co-produções parece-me também - digam o que disserem todos aqueles que no cinema apenas vêem interesses comerciais - o mais clamoroso atentado à concretização dum cinema nacional com personalidade própria. Fala-se de estruturas, infra-estruturas e mais quejandas coisas, apenas para camuflar desígnios inconfessáveis que todos bem conhecemos, conscientes como estamos de que Portugal nunca poderá ser uma oficina de cinema enlatado para consumo universal. Nem isso nos interessava nada!

Mas, não nos trará algumas coisas boas a nova Lei? Pois concerteza que sim. Se ela for cumprida nessas alíneas. Mas a melhor ajuda que ela nos poderia dar - arrisco! - seria a de construir dois cinemas, um em Lisboa e outro no Porto, para estreia dos nossos filmes, livre de taxas de exibição e distribuição, que nos levam quase a totalidade das receitas nos dois maiores centros de rentabilidade, o que quase sempre impossibilita a recuperação dos capitais investidos. Os filmes - sem discriminação - seriam ali estreados pela ordem do seu acabamento e estariam no cartaz o tempo que o público entendesse. Às salas, administradas pelo Instituto, poderia dar-se os nomes de "Paz dos Reis" no Porto e - porque não - "Leitão de Barros", em Lisboa. Quando não houvesse filmes para estrear, fazer-se-iam reposições e retrospectivas. Isso era ajudar o cinema português e dignificá-lo. (...) »

Excerto de uma entrevista a Manuel Guimarães, no Diário de Lisboa, em 1972 (data incerta).

Nota: a lei referida é a lei nº7/71 que cria o IPC, Instituto Português de Cinema, actual ICAM.
Foto: Vilarinho das Furnas, documentário de António Campos, 1971.

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