O meu interesse maior pelo documentário vem da noção de que muitas vezes a realidade ultrapassa a ficção. A realidade é múltipla, polimórfica, a várias vozes. A ficção é pessoal e unívoca. A realidade é muito mais equívoca. Mas, tal como o feitiço e o feiticeiro, às vezes a verdade vira-se contra o verdadeiro e o real contra o realizador.
O meu último filme, que só alguns ainda viram, tem provocado nos seus poucos espectadores uma dúvida incontornável. É que há cenas que, por parecerem inverosímeis, custa às pessoas aceitar que são reais. Custa-lhes pelo menos não ficar na dúvida, quando vêem aparecer um coquetel completamente banhado em luz vermelha e a música captada directamente a parecer posta de propósito para genérico do filme. Também noutras cenas de escola, a música parece escolhida para comentar as situações, mas ela foi simplesmente a selecção musical que os alunos fizeram naquele momento.
Creio mesmo que foi esse equívoco estilístico que motivou a recusa do meu documentário Doutor Estranho Amor no DocLisboa 2005. Também esta notícia foi para mim inverosímil e não consigo ainda compreender por que o excluíram, pois, embora saiba que a selecção está condicionada a um calendário limitado, o meu filme tem tudo para ser oportuno e bem aceite.
É o primeiro documentário feito em Portugal sobre o tema da educação sexual, que muita polémica tem alimentado nos últimos meses na opinião pública. É um filme político porque se aproxima um referendo sobre o aborto, situação real mas inverosímil segundo os padrões de toda Europa. (O DocLisboa assumiu no ano anterior essencialmente como um festival político. Ou deixou de o ser?) É um filme coeso, com situações muito interessantes, momentos fortes, personagens afirmativas.
Por último, este filme é urgente, porque há um tabu na nossa sociedade, não apenas em relação à sexualidade, mas sobretudo quanto a falar-se de SIDA, objectivo último da experiência de voluntariado que o documentário acompanha. A taxa de SIDA (número de novos casos por ano) em Portugal é a maior da Europa. Talvez isso não impressione ninguém, habituados que estamos a ocupar as margens estatísticas. Mas se olharmos o gráfico abaixo, podemos perceber como este problema é grave e tem sido escamoteado e ignorado – o que também é inacreditável.
Por último, este filme é urgente, porque há um tabu na nossa sociedade, não apenas em relação à sexualidade, mas sobretudo quanto a falar-se de SIDA, objectivo último da experiência de voluntariado que o documentário acompanha. A taxa de SIDA (número de novos casos por ano) em Portugal é a maior da Europa. Talvez isso não impressione ninguém, habituados que estamos a ocupar as margens estatísticas. Mas se olharmos o gráfico abaixo, podemos perceber como este problema é grave e tem sido escamoteado e ignorado – o que também é inacreditável.Taxa de incidência anual por milhão de habitantes. Fonte: Abraço
Portugal apresenta a mais alta taxa de incidência (número de novos casos) da Europa de infecção pelo VIH - principalmente na faixa etária dos jovens – taxa que tem vindo a aumentar nos últimos anos, ao contrário da tendência europeia e contrastando especialmente com evolução de Espanha, França e Itália, países que haviam iniciado a década de 90 com valores mais desfavoráveis do que Portugal e que conseguem uma considerável melhoria no final da década.
“Segundo um estudo do Eurostat, divulgado a 10 de Setembro de 2002, Portugal é o único país da União Europeia onde se tem registado um aumento do número de infectados com o VIH e apresenta uma taxa de incidência (número de casos por milhão de habitantes) cinco vezes superior à média da comunidade. No 1º semestre de 2004 foram notificados 1515 novos casos de infecção pelo HIV.” (http://www.roche.pt/sida/estatisticas/portugal.cfm
Outros dados em: http://www.aidscongress.net/article.php?id_comunicacao=248
Sem comentários:
Enviar um comentário